Antes das férias de julho, professores, alunos e funcionários da FEA foram surpreendidos com a notícia de que o vice-diretor Joaquim José Martins Guilhoto, ex-chefe do departamento de Economia, deixaria a instituição para embarcar em uma nova etapa de sua vida profissional: a partir de setembro assumirá um cargo técnico na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, em Paris. A OCDE é uma organização internacional que promove políticas para o desenvolvimento econômico e bem-estar social em todo o mundo.
Referência internacional em análises estruturais de economias nacionais e regionais, utilizando como instrumental modelos de insumo-produto, Guilhoto tem em seu currículo 380 trabalhos publicados, desde 1985. “Se for calcular, dá em média uma por mês”, brincou o professor Eduardo Haddad, durante a homenagem realizada por colegas, alunos e ex-alunos, no dia 11 de agosto. Foi uma despedida muito emotiva. Alguns de seus atuais e ex-orientandos de pós-graduação quase não conseguiram terminar os depoimentos devido à voz embargada.
Além de apresentar as principais contribuições que o economista imprimiu em suas dissertações de mestrado e teses de doutorado, os filhos acadêmicos do professor Joaquim Guilhoto ressaltaram principalmente o seu “lado humano”. Receptivo, incentivador, aglutinador, apoiador, generoso e humilde. Foram muitos os adjetivos usados para definir as qualidades do mestre. Ao lado da esposa Laura, dos filhos Gabriel e Leonardo, dos pais e da sogra, Guilhoto ouviu atentamente a todas as apresentações.
Na homenagem, o companheiro do departamento de Economia e do Nereus (Núcleo de Economia Regional e Urbana da USP), Carlos Roberto Azzoni quis destacar o que considera um dos maiores talentos do professor Joaquim Guilhoto: o de “simplificar o complexo”. Essa facilidade do economista, Azzoni pôde comprovar numa viagem de trem, na Europa, após um congresso científico. Guilhoto conseguiu desenhar em menos de duas horas o que é hoje o sistema inter-regional de insumo-produto. “Tínhamos combinado e ele levou seu bloco e caneta. Ficamos bolando o sistema. Mas ele foi responsável por 99% de tudo. Minha parte se resumiu à ideia, não fiz mais nada”, admitiu Azzoni.
..........................................................................
A generosidade do professor Joaquim Guilhoto foi apontada várias vezes durante o evento em sua homenagem. Desde os memoráveis cafés que pagava para os alunos, até a criação de uma entidade para auxiliar financeiramente os estudantes menos favorecidos. Em 2006, quando era chefe do departamento de Economia, decidiu montar, ao lado da professora Diva Pinho, a Amefea (Associação dos Amigos da FEA). Membro da diretoria, Leila Chicoli elogiou a iniciativa de Guilhoto e disse que a entidade contribuiu para a formação de seu filho Raí.
Atuais alunos da pós-graduação e ex-alunos que vieram de outras instituições também contaram que o professor Guilhoto foi o responsável por “abrir as portas da universidade”. A doutoranda Jaqueline Visentin foi uma delas. Formada pela Unesp, disse que conheceu o mestre há cinco anos, quando realizava uma pesquisa para seu mestrado e precisava conhecer a metodologia de análise do insumo-produto. “O professor foi fundamental para que eu conseguisse entrar na USP”, contou Jaqueline, que teve de passar pelo “teste da Bíblia”. Nesse caso, a bíblia era o livro “Input-Output Analysis: Foundations and Extensions”, de Miller e Blair. Ler o livro era uma espécie de rito de passagem para qualquer pretensão de fazer mestrado ou doutorado na FEA sob a orientação de Guilhoto.
Em reconhecimento às suas contribuições, o Nereus montou a Genealogia Acadêmica do professor Joaquim Guilhoto, distribuída durante a homenagem. Produzido por Eduardo Haddad e Jesús Mena-Chalco, o documento reúne todas as orientações realizadas ao longo de sua vida docente. Guilhoto possui 30 “filhos acadêmicos”, que por sua vez geraram 168 netos e 18 bisnetos. Seu pai acadêmico foi o prof. Werner Baer, que o orientou na University of Illinois at Urbana-Champaign, onde defendeu seu mestrado (1984) e doutorado (1986), após fazer graduação em economia na FEAUSP.
Ao retornar ao Brasil, em 1986, foi trabalhar na Fipe. Deu aula de estatística aplicada no Mackenzie. Em 1988, apareceu a oportunidade de ingressar como docente da Esalq-USP, em Piracicaba. Começou a ministrar, entre outros, o curso de Microeconomia III cujo conteúdo básico era relacionado à teoria do insumo-produto e de modelos aplicados de equilíbrio geral. Seus conhecimentos na área foram aprimorados no pós-doutorado, no Regional Economics Applications Laboratory (REAL), em Illinois, dirigido pelo Prof. Hewings.
Em 2002, tornou-se professor titular da Esalq e no ano seguinte foi nomeado titular da FEA, onde foi chefe do departamento de Economia em duas ocasiões (2005-2009 e 2012-2014). Em 2014, eleito vice-diretor da FEA, tornou-se um importante braço-direito do diretor Adalberto Fischmann, com quem dividia responsabilidades numa espécie de gestão compartilhada.
Depois de receber tantos elogios e agradecimentos por suas contribuições durante a festa de despedida, Joaquim Guilhoto enfim revelou seu segredo: “Acho que vocês estão todos errados. Eu é que usei vocês”. Brincadeiras a parte, o fato é que o mestre foi escolhido entre tantos economistas no mundo para ocupar um almejado cargo na OCDE, comprovando após alguns meses do processo de seleção que ninguém “bate ele” quando o assunto é análise de insumo-produto.
Gente da FEA - Agosto_Setembro 2016
Seção: FEA Homenagem (capa)
Autora: Cacilda Luna