Perspectivas e Desafios para o SUS

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Enviado por eopen em sex, 16/03/2012 - 16:29

Denise Cyrillo e Marislei Nijishima debateram soluções para alocação de recursos em saúde no Brasil

Por Beatriz Montesanti

Como o Estado pode garantir a saúde? Essa foi a grande questão levantada pelas professoras Denise Cyrillo e Marislei Nijishima no terceiro dia de palestras do Ciclo Brasil do Futuro, organizado pelo Centro Acadêmico Visconde de Cairu na última semana de agosto.

De acordo com a professora Denise, os problemas de gastos com a saúde iniciam com a alocação de recursos que são, como de costume, escassos. Assim, onde e como o governo deve alocá-los? Há uma série de critérios econômicos, éticos e políticos que garantiriam resultados efetivos nesta alocação. Os problemas se resumem à conciliação entre equidade e eficiência quando se determinam ações que atendam a população de forma adequada.

Em termos mais concretos, a professora citou a solução da equidade vertical, de acordo com a qual aqueles mais necessitados devem receber mais auxílio em medicamentos e tratamento. Essa é a polêmica regra do “resgate de pobreza”. “Infelizmente, essa ainda é uma prática pouco usual”, acrescentou. Um exemplo nesse sentido é a Política Nacional de Medicamentos, que consiste na distribuição de medicamentos pelo SUS à população mais necessitada. No entanto essa medida apresentou diversos problemas desde sua criação: a lista de medicamentos que o governo doa aos pacientes ficou muito tempo sem atualização, enquanto novos surgiam no mercado. “O processo de incorporação de novos medicamentos era muito ineficiente, mas de 2010 para cá melhorou, está mais atualizado”.

Outro exemplo é da lei de 96, que determinou que pacientes com HIV deveriam receber medicamentos gratuitos. No entanto, os beneficiários acabavam sendo minorias privilegiadas de clínicas privadas. No Rio Grande do Sul, nesse período, 15% da população absorvia 30% do orçamento para medicamentos de alto custo. Ambas as medidas demonstram falhas explícitas do governo em alocar de forma adequada os recursos para a saúde. “A vontade do brasileiro é ter saúde garantida pelo Estado. Para tanto, é preciso aumentar a eficiência com gastos públicos”, concluiu.

Já a professora Marislei Nishijima abordou em sua apresentação a influência do setor privado na saúde, com a regulamentação do governo. “Com a privatização, passamos de um governo produtor para um regulador”, iniciou. Nesses termos, em 97, países ligados ao FMI tiveram que adequar suas legislações e o Brasil passou a aceitar diretrizes de propriedade do setor farmacêutico. Ou seja, o governo passou a regulamentar as patentes.

Foi assim que os genéricos, medicamentos bioequivalentes aos pioneiros, puderam entrar no mercado quando a patente dos originais expiravam. Isso fez com que medicamentos originais, principalmente os chamados similares (aqueles de marca, que possuem o mesmo princípio ativo dos originais, mas têm outro nome), perdessem grande parte de suas vendas. Em 2007, iniciou-se uma política de incentivo à concorrência, de forma que medicamentos similares pudessem se tornar competitivos.

Porém, de acordo com a professora, “O Brasil não produz princípio ativo, não produz P&D em quantidade significativa, isso é feito por um grupo seleto de países”. Ou seja, o país não produz medicamentos, apenas realiza o processo simplificado: importa o produto e o manipula (embala, por exemplo). “Quando o Brasil negociou os direitos de propriedade, houve uma negociação no período de 10 anos para que os países se adequassem. Índia e China, que já tinham uma certa indústria, ficaram aptos a produzir e se tornaram grandes exportadores. Nós não conseguimos fomentar isso.”

Por quê? A industria não logrou criar incentivos para a produção interna e empresas multinacionais continuaram a importar o princípio ativo de suas matrizes. A política de genéricos reduziu os preços médios, houve aumento de concorrência e o aumento da participação de genéricos no faturamento, no entanto, algumas questões persistem: o Brasil quer desenvolver e produzir o princípio ativo? No modelo indiano ou chinês?.

“No Brasil, gasta-se 9% do PIB em saúde, o que é razoável. Os EUA gastam cerca de 11%, mas o PIB deles é muito maior e é um gasto privado, enquanto o nosso é feito pelo governo e em saúde pública. Estamos no caminho.” , concluiu Marislei. Denise também deu sua opinião final: “Gostaria que o sistema de saúde cuidasse das pessoas para que fossem mais felizes, e não para que se tornem agentes econômicos”.