O pecado original do Euro

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Enviado por eopen em sex, 16/03/2012 - 17:10

> Simão Silber comenta sobre a crise na Grécia e seus desdobramentos na economia mundial.

Por Beatriz Montesanti

As manifestações populares e os violentos confrontos que tomaram recentemente as ruas da Grécia estão inseridos em um contexto muito mais amplo do que mostram as páginas do noticiário. O professor Simão Silber, da FEA, em conversa a respeito da crise que se alastra pela Europa, explica como tudo remonta à criação do Euro, há 12 anos.

“A ausência de homogeneidade entre os países em termos de estrutura econômica, flexibilidade e capacidade de adaptação a problemas está no âmago da questão da Grécia”. De acordo com o Prof. Simão, o pequeno país balcânico sempre foi relativamente atrasado no contexto da União Europeia: “Você não chega muito longe vendendo azeitona e iogurte. A Grécia é uma economia pequena, com um inchaço no setor público muito grande, com despesas previdenciárias perdulárias, muitas empresas estatais, protecionismos...” Assim, com a criação da moeda única, o país aproveitou a oportunidade para usar de maneira extensiva o crédito.

Os grandes gastos do governo eram então disfarçados nos dados, que apresentavam déficits fiscais e dívidas menores do que realmente eram. Foi apenas após uma década de irresponsabilidade financeira que a crise explodiu, com o governo de Panpadreu (2009), o primeiro a anunciar a forjadura dos números e divulgar a dramática situação na qual os gregos se encontravam.

Veio, assim, a União Europeia em socorro para evitar a falência do país. Foi definida a moratória  de metade da dívida e pacotes de salvamento, porém as medidas até agora tomadas não são suficientes. Para Simão, mesmo um ajuste fiscal radical não resolveria: “Vai demorar muito tempo para arrumar”.

A Grécia encontra-se em forte recessão, o PIB caiu mais de 15% e o governo, sem arrecadação, não atinge suas metas fiscais. Este, no entanto, não é um problema circunscrito à Grécia: logo atingiu Portugal, Irlanda, Espanha e Itália, entre outros países europeus. “Até os títulos franceses já pagam juros mais altos e a crise bate à porta da Alemanha”. O euro, para o professor, é o pecado original: “Alemanha e Grécia são diferentes em tudo, têm condições diferentes para enfrentar a adversidade, não deveriam, portanto, estar em um mesmo grupo”.

Agora, Simão diz que deve ocorrer uma reforma geral no país, uma lição de casa dolorosa, demorada, recessiva e com custo social imenso. “Não sei para onde a Europa está caminhando, mas o olho do furacão da crise mundial, hoje, está lá”. Mesmo a recente mudança de governos não acarretará grandes diferenças, as soluções tomadas são de longo prazo e impopulares. A sociedade está desencantada, decepcionada e desempregada, e assim enchem-se as praças em Atenas. “Os grandes culpados foram os governos e agora sobrou para o cidadão pagar a conta”.

No Brasil, a crise pode se manifestar com a contração do crédito. Empresas brasileiras que se financiavam em bancos europeus sairão prejudicadas e haverá maior cautela no consumo e no investimento. Nosso crescimento já desacelerou, assim como de outros países, como China e EUA.

“O mundo globalizado tem essa característica, se amanhã tiver uma grande desaceleração da China, nós iremos sofrer”, comentou o professor. A única coisa a se fazer, para ele, é ser cauteloso:  “Não podemos nos meter a ser uma ilha de prosperidade, o mundo está em crise e com uma profunda incerteza, o desempenho geral será modesto nos próximos anos”.

O professor sugere que, enquanto isso, na Europa, alguns tabus precisam ser quebrados, como a criação do euro bônus. “Tem muita gente competente para adotar uma decisão definitiva. Não se arrumou uma solução ainda porque nada é trivial, tem que se romper paradigmas, o que não foi feito até agora”, concluiu Simão.