Habilidades de carreira são pouco desenvolvidas nas universidades

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Enviado por milenan@usp.br em ter, 01/12/2015 - 12:04

Uma queixa bastante comum entre profissionais recém ingressados no mercado de trabalho é não terem desenvolvido, durante a graduação, algumas habilidades que seriam importantes para sua atuação profissional, tendo que aprendê-las no dia-a-dia do emprego. 

Uma queixa bastante comum entre profissionais recém ingressados no mercado de trabalho é não terem desenvolvido, durante a graduação, algumas habilidades que seriam importantes para sua atuação profissional, tendo que aprendê-las no dia-a-dia do emprego. Lucas Vestri é um deles. Formado em Administração pela FEA em 2014, Vestri entende que há um distanciamento entre o “mundo acadêmico” e a prática no “mundo real”. “É como se a faculdade transmitisse os primeiros 50% do que você precisa saber e o restante é apreendido com a experiência no mercado de trabalho”, afirma.

Que habilidades são essas?

A professora Tania Casado, especialista em carreira e comportamento organizacional, elenca como competências cruciais: autoconhecimento de seu potencial, planejamento da trajetória profissional, capacidade de negociar, percepção do outro, compreensão das diferenças, visão sistêmica, flexibilidade e diplomacia. Casado afirma que, na maior parte do tempo, com raras exceções, essas habilidades não são trabalhadas em sala de aula, devido à pouca disponibilidade de profissionais e estrutura institucional para tanto. “As universidades deveriam pensar nisso, dedicando-se a desenvolver esse tipo de noção em seus alunos”, diz.

Geralmente, a universidade se presta a compartilhar conhecimentos técnicos, de acordo com as carreiras de graduação e pós-graduação. Essas habilidades técnicas são denominadas hard skills, específicas para a realização de um trabalho e para a atuação em determinada carreira. Em contraponto, estão as soft skills, que seriam competências mais amplas e que profissionais de diversas áreas sentem falta. A professora Ana Cristina Limongi-França, especialista em gestão da qualidade vida no trabalho, explica que as soft skills se referem a aspectos comportamentais, psicológicos e mentais das relações, no mercado de trabalho e na sociedade como um todo. Elas precisariam ser aperfeiçoadas durante toda a formação, desde a escola.

Limongi aponta como soft skills essenciais boa comunicação e bom relacionamento com as pessoas ao redor, com especial atenção às relações interclasse e intergeracional: “O indivíduo precisa saber se comportar de acordo com seu interlocutor, não ficar tímido quando está lidando com ‘poderosos’, por exemplo. Não pode ter medo do poder econômico”. Além disso, a professora destaca o papel da diplomacia – “é preciso ter em mente que uma boa conversa é melhor do que um chilique” – e do reconhecimento e respeito às diferenças – “você não é o centro do mundo”.

Autogestão e planejamento de carreira são outros exercícios que deveriam ser focados, de acordo com as professoras. Desse modo, os profissionais conseguem ser mais assertivos em suas escolhas e guiar melhor suas trajetórias. A professora Tania diz que, como isso raramente é feito nas universidades, é comum que os estudantes recorram a consultores de gestão de carreira: “Não tendo isso na universidade, o aluno vai procurar um profissional, que senta com ele e o auxilia a planejar a carreira. Isso é muito positivo, mas a gente deveria fazer isso já dentro das universidades”.

Como a universidade pode contribuir para desenvolver essas habilidades?

Tania Casado acredita que é um dever da Universidade criar mecanismos que auxiliem os estudantes em suas carreiras. “A universidade fica muito mais preocupada em ensinar ferramentas e passar conceitos, e acaba deixando para a prática do estágio essa vivência da organização. O aluno vai para o estágio e encontra um trabalho travestido de estágio, quando ainda não tem o jogo de cintura para saber negociar e entender o outro”, afirma.

Segundo a professora, idealmente deveria existir uma área formal para isso nas universidades, com profissionais escalados para ajudar os alunos a gerirem suas carreiras e desenvolverem habilidades próprias para o convívio no mercado de trabalho. “Aqui na Universidade, nós temos conhecimento abarcado para isso, mas falta uma preocupação formal: alocar profissionais e recursos para isso”, afirma.

Enquanto isso, disciplinas de comunicação, gestão de carreira e outras competências – com exercícios práticos – poderiam ser mais exploradas. Gustavo Tasso, aluno de graduação em Administração, defende que técnicas de resolução de problemas deveriam ser trabalhadas. Tasso acredita que habilidades em comunicação também poderiam ser aperfeiçoadas. “Muitos trabalhos que somente são entregues, poderiam ser apresentados para a própria sala ou banca avaliadora”, diz.

O ex-aluno Lucas Vestri diz que “situações reais devem ser trazidas para a sala de aula, especialmente nas matérias optativas”. Como alternativa, ele aponta o papel das entidades estudantis, que, segundo afirma, são capazes de preencher certas lacunas. “Além da integração e convívio social, as entidades possibilitam o desenvolvimento de competências como negociação, comunicação com diferentes públicos e trabalho em equipe, que são tão ou mais importantes para o mercado de trabalho que o conhecimento objetivo”, pontua.